Hopper em Si Bemol

Ela sabia o quanto era daninha a luz do sol em um quarto vazio. Acordar, virar para o lado e perceber a ausência. Ao mesmo tempo, entender que o vazio era parte da escolha, e que as faltas se sustentariam a si mesmas, entre seus braços, e no que ela tocasse. Embora se soubesse responsável, a espera áspera continuava ali, monstro emergente, no sol de Hopper. Sempre havia sido assim. Interlocutores, gentes conhecidas, familiares... não escutavam o que ela dizia. Não havia alguém para abraçar e apenas. Ela tinha apenas que negar para que não fossem embora também os que ainda demonstravam um interesse gélido. Uma simpatia pálida. Naquela manhã, se deixara ficar na cama mais um pouco, coberta de sol. Os amanheceres, depois de amar sozinha, eram sempre mobiliados de uma torrente de pensamentos vãos. Lá embaixo havia o movimento – ainda que fugaz. Em seu quarto apenas pensamentos esparsos. Um sol caótico em cinza si bemol.

Imagem: The Morning Sun by Edward Hopper

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