Uma noite em Hollywood


Morávamos em um apartamento cujas paredes eram róseas e ásperas ao toque de minhas mãos pequenas, trêmulas e tímidas. Era uma unidade no andar térreo, perto da piscina, em frente a uma árvore. Perto de dois vãos que eram contáveis. Os outros não o eram. Era perto de onde os esquilos vinham bebericar água, e os pássaros juntar apetrechos que só eles, pássaros, em sua atarefada urdidura de ser, carregam de lá para cá e daqui para lá. Era pela janela da sala que entrava o sol da manhã. Na cozinha longa, branca, e morna, eu esquentava um café para garantir que o dia transcorresse - dentro da normalidade possível.
Foi de lá que caminhei até o Hollywood Bowl, em Los Angeles, muitas vezes. Era naquela cozinha e naquele apartamento que me apertava, que me sufocava, que eu aprontava minhas sacolas e, com meu agasalho ia me encontrar com a música. Foi lá que ouvi a Diva de Pés Descalços, ao vivo, pela primeira e única vez. Foi só e com as músicas dela que me senti em casa. Sob estrelas e sem imaginar o meu futuro e os caminhos que viriam depois. Foi lá, balbuciando mais que amor, desmedida, sem a real noção do quanto era possível encontrar naquela noite, que eu pertenci-a a uma felicidade, que não era qualquer, nem. ouvindo a Diva. Exaurida de ser. Já que quem tanto ama se reveste de pluma.

Para minha mãe, que me ensinou a viver de música.

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